“ChatGPT, posso te contar uma coisa?”: O risco de trocar o terapeuta por um robô

Foto Freepik

Nos bastidores silenciosos da era digital, uma cena cotidiana tem se repetido: pessoas solitárias, ansiosas ou apenas confusas, abrindo a tela do computador ou do celular para desabafar com uma inteligência artificial. “ChatGPT, posso te contar uma coisa?”, escrevem, como quem procura colo — ou ao menos, um lugar onde a dor caiba. A resposta vem rápida, articulada, empática. Mas será que é o suficiente?

A psicóloga Carla Salcedo, que acompanha de perto esse fenômeno, aponta um alerta importante: a IA, embora acessível e eficaz em alguns aspectos, não substitui a complexidade e a potência de uma relação humana. “Ela acolhe, mas não confronta. Responde, mas não escuta. Sugere caminhos, mas não caminha com você”, resume. É essa diferença — sutil, porém profunda — que marca o limite entre alívio momentâneo e cuidado verdadeiro.

Em um tempo marcado por vínculos frágeis e uma busca constante por respostas rápidas, a conversa com um robô pode parecer uma solução mágica. A ausência de julgamento, o tom gentil e a fluidez do diálogo criam a ilusão de vínculo. Mas, como lembra Carla, “o cérebro pode se sentir compreendido ao ler uma resposta coerente, mas isso não significa que houve transformação emocional”.

Mais preocupante é quando esse hábito vira substituição: quando o Chat se torna o confidente exclusivo, o conselheiro idealizado, o “amigo que nunca falha”. Isso, segundo a psicóloga, tende a fortalecer o isolamento, impedir o enfrentamento da dor e retardar a busca por ajuda profissional. “A IA nunca vai perceber seu silêncio desconfortável, nem o tremor na sua voz. Ela não sente. Não escuta de verdade. E o cuidado exige presença”, diz.

Isso não quer dizer que a tecnologia deva ser descartada. Ela pode ser útil como apoio: para organizar ideias, nomear sentimentos ou até preparar uma sessão de terapia. Mas é preciso reconhecer seus limites e não romantizar o que é, no fim das contas, uma ferramenta algorítmica.

Se o Chat virou refúgio diário ou se você sente que já não busca escuta humana, talvez seja hora de parar e olhar para esse comportamento com mais atenção. “A IA pode apoiar, mas não trata. Pode aliviar, mas não cura. Pode parecer companhia, mas não constrói vínculo”, finaliza Carla.

Porque, no fim, cuidado de verdade não vem da tela. Vem do encontro.

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