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Nos últimos meses, a indústria cinematográfica chinesa vem testando os limites da inteligência artificial (IA) ao remontar clássicos do kung fu com versões digitais dos ícones Bruce Lee, Jackie Chan e Jet Li. Produções como A Legend, que traz Jackie Chan jovem, com cerca de 27 anos, recriado digitalmente, e remakes de cenas históricas levantam debates acalorados sobre autenticidade artística e preservação cultural.

Chan, figura central dessas discussões, destaca sempre quando trata do assunto que a essência do kung fu reside na alma e na disciplina, valores desenvolvidos ao longo de décadas de prática. Mesmo reconhecendo os benefícios da IA para a segurança em cenas perigosas, ele alerta que é impossível replicar esse “espírito filosófico” com tecnologia, por mais avançada que seja. A recriação digital de jovens atores, segundo ele, pode amenizar lesões e reduzir custos, mas jamais substituir a bagagem emocional e técnica de um artista que viveu cada passo.

Os cineastas chineses, por outro lado, veem na IA uma ferramenta de preservação cultural. Recriar visuais perdidos pelo tempo seria uma forma de ressignificar obras-primas e reintroduzi-las num mercado global renovado. Nesse cenário, projetos como Once Upon a Time in China, estrelado originalmente por Li, ganham novas versões com tecnologias que recriam sequências inteiras e ângulos antes inalcançáveis.

Entretanto, a crítica cresce sobre o uso indiscriminado dessas tecnologias. A manipulação digital levanta questionamentos sobre direitos de imagem especialmente após experiências como A Legend, que foi amplamente criticada por efeitos visuais artificiais demais. Para a indústria, falta dialogar com roteiristas, atores e diretores sobre o quanto da obra original pode ser alterado sem descaracterizar sua essência.

O uso da IA na cinematografia chinesa simboliza uma encruzilhada entre tradição e modernidade. Redescobrir o rosto de estrelas do passado é fascinante, mas requer sensibilidade, uma vez que preservar o carisma e a autenticidade é vital. Caso contrário, corre-se o risco de cristalizar memórias em versões vidrificadas, desprovidas de vida e expressão.

Como em qualquer revolução tecnológica, fica claro que o que está em jogo não é apenas o que se pode fazer, mas o que se deve preservar. A reinvenção digital precisa andar junto de um compromisso ético com o legado. E cabe agora à indústria equilibrar inovação e respeito pelas histórias que moldaram o kung fu antes que suas raízes sejam amputadas por códigos e algoritmos.

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