
A expressão economia da ansiedade não é exagero retórico, mas descrição de um fenômeno no qual inquietações humanas são transformadas em recursos exploráveis. Empresas de tecnologia identificam gatilhos emocionais, criam ferramentas para administrá-los e sustentam o desconforto que afirmam reduzir.
Aplicativos de rastreamento vendem segurança, mas também produzem novos temores. Se o sinal de geolocalização de um filho se interrompe, surge a necessidade de verificar, ligar e conferir. O que deveria tranquilizar aprofunda a sensação de vulnerabilidade. A promessa de controle absoluto reforça a dependência e impede a elaboração natural da incerteza.
Esse ciclo não é casual, mas calculado. Algoritmos testam milhões de microintervenções para descobrir quais notificações provocam maior impacto emocional. Cada concordância com termos de uso nos insere em um vasto experimento de comportamento. O sofrimento, em vez de ser enfrentado, é incorporado como mecanismo de engajamento e retorno financeiro.
O marketing encontra potência na identificação de lacunas entre o eu real e o eu ideal. No campo da parentalidade, a figura da mãe culpada simboliza essa manipulação. O reconhecimento de que não é possível estar presente em tempo integral é transformado em culpa, que se converte em consumo de produtos, aplicativos e serviços.
Mesmo diante de estatísticas que revelam sociedades mais seguras, o viés de atenção aos eventos extremos mantém a percepção de ameaça sempre acesa. A discrepância entre dados e sentimentos é explorada comercialmente, criando um estado em que o indivíduo não encontra descanso.
Esse processo revela um paradoxo clínico. Quanto mais se tenta suprimir a ansiedade, mais ela se expande. A suposta solução, em vez de reduzir sintomas, reforça a permanência no ciclo de vigilância. O sujeito torna-se refém do dispositivo que deveria oferecer proteção.
Refletir sobre esse cenário exige reconhecer que não se trata apenas de uma transformação mercadológica, mas de uma mudança cultural. O mal-estar deixou de ser enfrentado com elaboração simbólica e passou a ser tratado como oportunidade de consumo.
Questionar esse modelo é fundamental. Não se trata de negar a utilidade da tecnologia, mas de compreender que a captura da atenção e a exploração da vulnerabilidade psíquica não podem ser naturalizadas. A economia da ansiedade é sintoma de nosso tempo, e enfrentá-la exige consciência crítica para que a experiência subjetiva não seja reduzida a métrica de engajamento.
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