Coluna de Antonio Delfim Netto

1. Os problemas com a produção de biodiesel mostram as dificuldades dos programas econômicos e sociais que procuram atingir mais de um objetivo. Para criar condições que permitissem aumentar a renda da agricultura familiar (o que é muito bom), a ANP (Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Bicombustíveis) que compra o biodiesel em leilões periódicos, estabeleceu duas quotas: 1ª) 80% das compras são feitas de empresas que possuem o “Selo Combustível Social”, que, necessariamente, devem comprar parte da matéria prima da agricultura familiar (por exemplo, a mamona) e 2ª) 20% das compras são feitas das empresas que não possuem o “Selo”.

2. Para garantir a oferta da matéria prima, as empresas contratam (por preço fixado) a compra da produção dos pequenos produtores. Frequentemente elas fornecem as sementes, assistência técnica e algum crédito para a produção da oleaginosa escolhida na parceria. O problema é que quando o preço de mercado no momento da safra é superior ao estabelecido nos contratos, o pequeno produtor é tentado a vender sua produção no mercado e descumprir o contratado. Isso aumenta o risco da operação: a empresa, sem a matéria prima contratada, tem que produzir o biodiesel utilizando a soja que é a matéria prima universal (80% do biodiesel é produzido com ela) e perde o “Selo”, com grave prejuízo econômico e importantes danos morais (que afetam seu crédito). Há uma falta de simetria: as centenas de pequenos agricultores que descumpriram o contrato praticamente nada sofrem, a não ser, em alguns casos, um litígio interminável na Justiça que acaba perdoando-os!

3. Isso é parte da insegurança jurídica que cerca hoje quase toda a atividade agrícola sujeita ao vandalismo comandado por misteriosas organizações (sem personalidade jurídica!) protegidas pela frouxidão do Governo. É um exemplo típico de como o excesso de proteção no curto prazo acaba, no longo prazo, prejudicando o protegido…

Por Antonio Delfim Netto

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