TRISTES TRÓPICOS
Quando morre uma personalidade da grandeza do francês Claude Lévi-Strauss (1908-2009), todas as palavras parecem insuficientes para falar da dimensão de sua obra e do significado de sua perda. Mas, ao mesmo tempo, não se pode deixar de falar do assunto, e não basta dizer que a morte de Lévi-Strauss, o pai da antropologia moderna e pensador que influenciou as ciências humanas com seu projeto estruturalista, no sábado, 31 de outubro, foi anunciada nessa terça, 3, pela Academia Francesa, e está sendo lamentada no mundo inteiro. Assim, melhor é deixar a obra de Lévi-Strauss falar por si mesma. A coluna selecionou dois livros que considera fundamentais para entender o pensamento do antropólogo.
“As Estruturas Elementares do Parentesco” (1949) – Este livro é considerado o marco fundador da antropologia estrutural. Nele, Lévis-Strauss trata da teoria geral dos sistemas de parentesco dividida em 29 capítulos e desmistifica questões sobre os laços sanguíneos, como o incesto e suas relações culturais em diversas sociedades. O autor, em diálogo com Sigmund Freud, analisa a questão da proibição do incesto, não pela perspectiva da moral, mas como fator lógico de constituição da sociedade.
“Tristes Trópicos” (1955) – Para muitos esta é a obra-prima de Lévi-Strauss: uma espécie de autobiografia intelectual em que ele relata, entre outros episódios, sua vinda ao Brasil nos anos 1930, juntamente com outros professores franceses, para trabalhar na fundação da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo. Numa prosa ao mesmo tempo poética, melancólica e irônica, uma narrativa de viagem e também um ensaio de ciência, Lévi-Strauss questiona se ainda somos humanos o bastante para compreender os índios com os quais ele entrou em contato no Brasil. Mas “Tristes Trópicos” não é só um clássico dos “estudos brasileiros”, é também uma obra universal sobre a civilização mundial, marcada, segundo ele, pelo inchaço demográfico e pela homogeneização cultural. Lévi-Strauss disse certa vez que o Brasil era a experiência mais importante de sua vida, pois foi no contato com as tribos indígenas brasileiras que descobriu sua vocação para a etnologia e a antropologia. Ele chegou ao país pela primeira vez em 1935, quando tinha 27 anos de idade, e as viagens que fez à região Centro-Oeste e à Amazônia foram decisivas para ele. Em 1936, visitou os índios cadiuéu na fronteira com o Paraguai e os bororó no Mato Grosso. Três anos mais tarde, retornou à tribo bororo e conheceu os tupi-kaguahib, hoje considerados extintos. O primeiro fruto editorial desses contatos foi “Família e Vida Social dos Índios Nambiquara”, de 1948. A experiência de ter sido objeto de estudo de Lévi-Strauss também foi fundamentalpara o Brasil.
Por Anna Lee