
Com voz firme e afeto, Amanda tem transformado o que começou como um espaço de resistência no Instagram em um verdadeiro movimento de celebração do cabelo crespo e da identidade negra. À frente do perfil “Tô de Crespa”, Amanda Mendes compartilha vivências que atravessam o autocuidado, a autoestima e o ativismo, sempre com a consciência de que beleza também é política. Nesta conversa, Amanda reflete sobre as conquistas e os desafios da representatividade no mercado de beleza, fala da responsabilidade de criar conteúdo com propósito e deixa um recado potente para quem está trilhando o caminho da transição capilar.
Sua trajetória nas redes começou como um espaço de resistência e celebração do cabelo crespo. Hoje, como você enxerga a evolução da conversa sobre representatividade na beleza?
Quando eu comecei a Tô de Crespa, era no grito mesmo. A gente falava de representatividade porque não se via em lugar nenhum. Hoje, eu vejo que a conversa evoluiu, sim, tem mais gente falando, tem mais visibilidade… mas ainda falta escuta, sabe? Representatividade não é só aparecer na campanha, é ser ouvida, é estar nas decisões. Ainda existe um delay entre o que a gente vive e o que o mercado entrega. Então, pra mim, a missão continua: mostrar que beleza negra não é nicho, é potência, é centro.
Quais foram os maiores desafios e aprendizados ao transformar sua vivência com o cabelo crespo em conteúdo que inspira tanta gente?
O maior desafio foi entender que minha história não era só minha. Cada vez que eu falava de um trauma, de uma insegurança, de um momento de libertação… tinha sempre alguém do outro lado dizendo: “eu também”. E aí vira responsabilidade, sabe? Mas também é o que me move. Aprendi que transformar vivência em conteúdo é, antes de tudo, um ato de cuidado coletivo. Não é só sobre cabelo, é sobre como a gente se enxerga, se respeita, se cura. E eu continuo nesse processo junto com quem me acompanha.
A estética e os rituais de cuidado com o cabelo crespo têm uma dimensão política. Como você equilibra beleza, autenticidade e posicionamento nas suas produções?
Pra mim, tá tudo junto. O jeito que eu me visto, o jeito que eu uso meu cabelo, como eu cuido de mim — tudo isso é sobre dizer quem eu sou no mundo. E, sendo uma mulher negra com cabelo crespo, isso já é um ato político por si só. Eu não preciso forçar um discurso, porque ele tá ali, em cada imagem, em cada legenda, no que eu escolho mostrar. A beleza faz parte, mas não é vazia. É carregada de história, de escolha, de presença. E a autenticidade vem disso: da minha liberdade de ser inteira, com afeto e com intenção.
Você acredita que o mercado de beleza está mais atento às necessidades da mulher brasileira? O que ainda precisa mudar?
Tá mais atento, sim, mas ainda não escuta com profundidade. Tem muitas marcas surfando a onda da diversidade, mas sem colocar a diversidade no centro da criação. Eu sinto que o mercado começou a perceber o poder de consumo da mulher brasileira, mas nem sempre entende o que a gente quer de verdade. A gente quer produtos que funcionem, claro, mas também quer respeito, coerência, representatividade de verdade. E isso só acontece quando tem pessoas negras e originárias dentro das empresas, nas campanhas, no backstage, em cargos de decisão. Porque não basta aparecer na foto: a gente precisa estar na construção de tudo, desde o início.
Na sua rotina, quais produtos ou cuidados são indispensáveis para manter os fios saudáveis e cheios de personalidade?
Meu cabelo é crespo, poroso e tem personalidade (risos). Então eu invisto em hidratação real: máscara potente, umectação com óleos vegetais e um finalizador que respeite a estrutura do fio, sabe? Uso secador com cuidado, proteção térmica é obrigatória, e gosto de produtos que destaquem minha curvatura, mas deixem meu volume livre. Mas, pra mim, o mais importante é ritualizar esse cuidado. Entender que não é sobre domar o cabelo, é sobre me conectar com ele. E ele responde quando é tratado com verdade.
Que conselho você daria para meninas crespas que estão começando a se reconectar com a própria identidade por meio do cabelo?
Primeiro: respira. Vai no seu tempo. A transição é um caminho de volta pra você mesma, e ele não precisa ser rápido nem linear. Se acolhe, se escuta, se cerca de referências que te façam bem. Seu cabelo não é problema — nunca foi. O problema é o que disseram pra você sobre ele. Então se fortalece na sua história, se permita errar, testar, se redescobrir. E lembra: tem muita gente te esperando do outro lado da transição. E a gente vai juntas.
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