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Apareceu recentemente nas locadoras o filme “Depois do Ensaio” de Ingmar Bergman. Rodado em 1984, logo depois de Fanny e Alexander, só agora ele ganhou sua versão em DVD. Se você espera sexo, melhor nem seguir lendo, porque o filme não trata disso. Então o que ele faz numa coluna chamada “Entre Lençóis”? Em primeiro lugar porque um Bergman é sempre um Bergman, e nesses tempos de baboseira e miséria emocional o lançamento de um filme do mestre sueco tem que ser comemorado.

Em segundo lugar, porque fala de pensamentos e sentimentos como quem abre um baú muito bem lacrado, que andou por tempos escondido. E todos sabemos que, diferentemente do sexo, que pode ser simplesmente carnal, o erotismo nasce da sofisticação psíquica.

Henrik Vogler, um diretor de teatro interpretado por Erland Josephson, está em seu teatro, depois do ensaio de sua nova montagem de “O Sonho”, de August Strindberg, quando a atriz Anna, interpretada por Lena Olin, aparece com o pretexto de buscar um bracelete. Juntos eles vão discutir a relação dela com a mãe, Rakel – Ingrid Thulin – também atriz, que morreu alcoólatra e teve um caso com Henrik no passado.

Entre questões que envolvem a peça, o processo de atuar e dirigir, lembranças do passado, e o possível desenvolvimento da relação dos dois, eles vão revelando matizes incomuns de sentimento, como quem vai retirando, uma a uma, as escamas emocionais. Não fosse pelo pensamento sofisticado de Bergman ou pela maneira como toca em questões delicadas a todos nós, o filme já valeria por uma cena, quase no final, onde Henrik imagina com Anna como poderia ser o relacionamento deles, abreviando desgastes, sofrimentos, e, é claro, tudo o que poderia haver de vida entre eles. Um soco no estômago para quem tem o péssimo hábito de fugir das emoções com medo de se machucar. Por que, no frigir dos ovos, é assim  que se vive, mesmo sabendo o final.

E se artistas não podem inventar histórias diferentes do clichê ou da assepsia descrente, o que resta a nós, pobres mortais? Mas a verdade é que, além do medo e da diferença de idade, existem outras impossibilidades nessa relação, que a delicadeza ou o desejo de manipulação não permitem ao diretor revelar – o contrário do que pede a cartilha newtoniana de causa-conseqüência inventada pelo cinema americano e que vigora em boa parte dos filmes contemporâneos. Veja, veja, veja, com a inquietação que Bergman exige de nós.

 Foto: Reprodução

 

 

Por Luciana Pessanha

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